quinta-feira

Os tempos que vivemos…

Nestes anos inaugurais do séc. XXI temos vindo a assistir a uma profunda alteração nas configurações urbanas. Além do incontornável crescimento urbano, assistimos à crescente importância das cidades e regiões metropolitanas no desempenho económico dos territórios nacionais e internacionais. Ou seja, a emergência desta nova era caracterizada pela crescente importância do conhecimento, inovação e criatividade, acompanhada das tendências para a globalização e disseminação da informação, comunicação e tecnologias mediáticas; é marcada pela ascensão das cidades enquanto arenas da competitividade territorial e portanto pelo reconhecimento geral da contribuição das cidades para o desenvolvimento regional.
Este artigo pretende promover a discussão sobre a diversidade de relações entre as indústrias culturais e as politicas culturais (iniciativas e retóricas governamentais). Quais são as ideologias que estão por detrás destas politicas? Como se relacionam com outros tipos de politica cultural, inclusivamente aquelas orientadas para os media, comunicação, artes e património?

Não há dúvida de que as indústrias culturais são fontes de riqueza e emprego em muitas economias: basta pensar na importância da indústria cinematográfica e discográfica nos EUA, como no papel dos jornais e das revistas em todo o mundo. O advento das marcas (Coca-Cola, Nike, Disney, entre milhões de outras) fez crescer as indústrias culturais na publicidade, nos filmes e na influência na forma como entendemos o mundo. As sociedades modernas são sociedades do conhecimento e da informação e isso basta para provar o papel que as indústrias culturais têm na economia e na cultura.

Nos últimos anos tem havido um boom de interesse na ideia das indústrias culturais tanto nos meios académicos como nos círculos de realização das políticas. Esta explosão tanto na escrita como no pensamento sobre as indústrias culturais e criativas tem sido em parte influenciada pelo desenvolvimento nas políticas, mas sobretudo porque suscita questões acerca das fronteiras entre cultura e economia, entre arte e comércio.

Neste sentido, os medos modernistas da industrialização e da desvalorização da arte e da cultura alimentou as políticas culturais de um modo complexo. Ou seja, a política cultural da Europa ocidental conduziu à democratização, inclusão e maior acesso à cultura pelo povo (crença de que a cultura civiliza); mas simultaneamente à exclusividade na forma de subsídios para os produtores de algumas formas de alta cultura (que ajudaram a moldar a politica cultural). As indústrias culturais eram, assim, o outro contra quem as politicas culturais reagiam.
Mas na segunda metade do século XX, o crescimento das indústrias culturais acelerou, determinado por um grande número de factores, a saber, a prosperidade crescente do Norte Global, o aumento de tempo de lazer, os níveis crescente de literacia, as ligações entre os novos meios da televisão e os novos meios do consumismo, bem como a importância crescente dos equipamentos culturais. De tal modo que em finais dos anos 80 do século XX, era impossível aos planeadores das políticas culturais ignorar o crescimento das indústrias culturais. Lembremos, em especial, o trabalho da UNESCO no reconhecimento da dimensão económica da cultura e o seu impacto no desenvolvimento (por exemplo as listas de locais e tradições consideradas como Património Cultural da Humanidade – consultar http://portal.unesco.org/ ).
No inicio dos anos 90, a colecção “Cultural Policy and Urban Regeneration” editada por Franco Bianchini e Michael Parkinson, providenciou um conjunto de estudos de caso (Glasgow, Roterdão, Bilbao, Bolonha, Liverpool, Hamburgo, Montpellier, Rennes) esclarecedores de como a politica cultural estava a ser aplicada na Europa ocidental (tanto centrada em projectos de museus e outros edifícios, como em iniciativas ligadas às industrias culturais) como forma de regeneração urbana.

Durante este período, as indústrias culturais começavam a ter impacto na realização das políticas nacionais perspectivadas como modo de revitalização das economias nacionais pós-industriais. Simultaneamente as indústrias culturais começaram a emergir como uma questão de políticas locais.
O poder autárquico, em Portugal, tem vindo a expandir as suas áreas de intervenção. Se no pós 25 de Abril as Câmaras Municipais se ocupavam essencialmente da pavimentação das ruas, do fornecimento de água e do saneamento básico; hoje as atribuições próprias das autarquias são muito mais extensas.
A intervenção cultural é uma das áreas que os municípios chamaram à sua responsabilidade, em alguns casos com grande sucesso. Factor preponderante para o desenvolvimento local em cidades de pequena e média dimensão e um indicador na avaliação da qualidade de vida das populações; a actividade cultural, advém frequentemente, da sociedade civil, organizada em colectividades ou associações sem fins lucrativos. Às políticas culturais cabe, neste sentido, o papel de definir as prioridades, regulamentar o apoio público, a articulação com outras áreas socio-políticas relevantes (educação, juventude, inserção social, p.ex.) e a decisão sobre a intervenção directa dos orgãos públicos (consultar a página do Observatório das Actividades Culturais para espreitar mais perspectivas sobre este assunto em http://www.oac.pt/ ).As alterações, supra mencionadas, que sustentaram o crescimento das indústrias culturais, acrescentaram simultaneamente legitimidade à ideia de que as economias nacionais e locais podem ser regeneradas através das indústrias culturais. O maior feito das industrias culturais, aos níveis urbano, regional e nacional, foi que a politica cultural, previamente marginalizada em muitas áreas de governação, podia agora ser vista como economicamente relevante, numa era em que a politica é julgada primeiramente em termos de recompensas fiscais. Mais, a politica das indústrias criativas pode ser retratada como democratizante e anti-elitista, em oposição ao suposto elitismo das políticas da arte destinadas a subsidiar a produção cultural que não podia resolver os seus custos através do mercado. Contudo, as politicas das indústrias criativas continuam a ter problemas de avaliação de mérito na relação com os outros produtos culturais.

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