quarta-feira

O Muro da vergonha

"A queda dos muros (2)

Celebram-se 20 anos da queda do “muro da vergonha” e, subsequentemente, do desmoronamento do regime soviético. Esse momento de viragem inaugurou novas esperanças e abriu novos horizontes às sociedades do Leste europeu. Ao mesmo tempo, simbolizou um golpe de morte no modelo “socialista” de sociedade e revelou os paradoxos, os recalcamentos e os contrastes sociais escondidos sob aquele manto ideológico. Adeus Lenin (de Wolfgang Becker) é um filme que se aconselha a rever, porque nos ajuda a compreender o significado dos dramas sociais, das esperanças e frustrações reveladas entre os escombros do muro de Berlim.
Como afirmaram Marx e Engels, “tudo que é sólido se dissolve no ar” (Manifesto), e foi isso mesmo que aconteceu à velha utopia do socialismo do Leste. Mas a erosão não ocorreu apenas a Leste. O fenómeno repetiu-se igualmente a ocidente, perante a rápida negação da “utopia capitalista” (do desenvolvimento ilimitado e do bem-estar para todos), sonhada por muitos dos que saltaram o muro como o mundo da opulência, da liberdade e das oportunidades. Numa Europa ocidental cuja coesão social e Estado providência já estavam em crise, rapidamente se percebeu que as liberdades políticas se conjugavam aqui com desigualdades, com miséria e injustiças crescentes, com o aumento da pobreza e do desemprego. As próprias classes médias – e o correlativo consumismo e individualismo – que haviam feito a inveja dos filhos do operariado da ex-RDA já davam sinais de fraqueza e proletarização.
Caiu um muro mas outros se ergueram. Os muros estão ao nosso redor e também dentro de nós. Estão nas múltiplas e díspares ortodoxias constantemente reinventadas. Dentro da Europa nos novos despotismos, das novas segregações, preconceitos, tráficos e exclusões de todos os tipos. Como retrata o recente filme de Costa Gravas (Éden à l’Ouest), o paraíso europeu transporta e promove no seu seio uma sucessão de infernos – ou pequenos gulags – onde o mais inocente dos crentes está sujeito a mergulhar. Com sorte, poderá subsistir no purgatório. Mas o sacrifício de muitos é a salvação de uns poucos." in http://boasociedade.blogspot.com/ de Elisio Estanque

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