quinta-feira

Alexandre Alves garante incentivos de 128 milhões para fábrica em Abrantes


O empresário Alexandre Alves em 1992, quando ainda era dono da Fnac e concorria à presidência do Benfica.

"A unidade de painéis solares, que integra um investimento total de mil milhões, arranca em Julho.

A RPP Solar, responsável por um dos maiores projectos industriais na área de painéis solares, localizado em Abrantes e avaliado em mais de mil milhões de euros, vai receber 128 milhões de euros de incentivos, ao abrigo do Quadro de Referência Estratégica Nacional (QREN). Deste pacote, 58 milhões de euros referem-se a incentivos de natureza financeira, os quais serão disponibilizados à medida que o equipamento de produção for instalado, e 70 milhões de euros têm cariz fiscal, recaindo sobre os lucros que sejam gerados pela RPP Solar.

Em declarações ao Diário Económico, o responsável pelo projecto, o empresário Alexandre Alves, refere que a taxa de apoio - que varia entre 6,46% e 7,8% -, fica, ainda assim, bastante aquém dos dez maiores projectos já aprovados pelo QREN.

Com o arranque da produção previsto para Julho, o projecto é composto por cinco unidades industriais que serão construídas em três fases: duas este ano, mais duas em 2011 e a final em 2012 - esta última será também a de maior capacidade instalada e a que irá absorver a fatia de leão do investimento global: 400 milhões de euros."

Prioridades vão para o sector alimentar, da metalomecânica, da energia e das tecnologias de informação e comunicação

"Tagusvalley investe 3,7 milhões de euros para criar e desenvolver novas empresas

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Projecto vai permitir a constituição de mais naves industriais no Tecnopólo do Vale do Tejo


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A Tagusvalley - Associação para a Promoção e Desenvolvimento do Tecnopólo do Vale do Tejo, criada há dez anos em Abrantes, viu aprovada uma candidatura de 3,7 milhões de euros - apresentada conjuntamente com a Universidade da Beira Interior – que vai permitir a criação de mais naves industriais nesse parque de ciência e tecnologia. A aposta passa por acelerar a constituição de empresas que desenvolvam a sua actividade em quatro áreas consideradas estratégicas: o sector alimentar, da metalomecânica, da energia e das Tecnologias de Informação e Comunicação (TIC).

O financiamento, assegurado pela Comissão de Coordenação e Desenvolvimento Regional da Região Centro, permite que, depois de uma fase de incubação, as empresas se alojem em naves específicas para aceleração do seu processo de constituição. Aposta também no reforço da relação do Tecnopólo com a população, pretendendo-se, por exemplo, substituir os muros de tijolo e cimento que actualmente circundam este espaço por uma vedação transparente, de modo a que as pessoas possam ver o que ali se passa.

“O objectivo passa por acelerar a constituição de empresas de base tecnológica neste parque de ciência e tecnologia contribuindo para o desenvolvimento não só do concelho como de toda a região”, disse na quinta-feira, 13 de Maio, a presidente da Câmara de Abrantes, Maria do Céu Albuquerque (PS), que anunciou o investimento. Desde a sua implantação, o Tecnopólo ajudou a criar doze empresas embora tenha estabelecido contactos com dezenas de empresários. A autarca sustentou que com estes 3,7 milhões de euros é atingido o limite de investimento previsto para os primeiros dez anos de vida do Tecnopólo, contabilizando hoje um total global de 8 milhões de euros investidos.

A Tagusvalley encontra-se também a trabalhar na elaboração de um Plano Estratégico, desenvolvido pela empresa de Augusto Mateus & Associados (AM&A), que estará concluído em Julho. O objectivo deste plano, de acordo com Sérgio Lorga da AM&A, passa por perspectivar “que passos podem ser dados para que o sucesso seja cumulativo e se criem mais condições para acolher novas iniciativas empresariais” e “para que as pessoas que são de Abrantes possam construir carreiras desafiantes e, em simultâneo, fazer com que a região se desenvolva”.

Nessa sessão esteve ainda presente o economista inglês Bob Hogdson para quem o principal desafio deste parque passa por “mudar a mentalidade dos empresários, actuais e futuros, face à questão da tecnologia”.

Implantado na zona industrial de Alferrarede, em Abrantes, com sete empresas em fase de incubação e 60 investigadores, formadores e empresários em permanência, o Tecnopólo do Vale do Tejo tem na Tagusvalley a entidade gestora de um conjunto de infra-estruturas de acolhimento e serviços de inovação e desenvolvimento tecnológico que visam apoiar e fomentar o empreendedorismo empresarial.

O Inov.point, centro de inovação e incubação de empresas, o A.Logos, laboratório para análises microbiológicas e físico-químicas em águas e alimentos, um pólo de formação do Instituto de Emprego e Formação Profissional (IEFP) e o Inov’Linea, centro de transferência de tecnologia para o sector alimentar, são alguns dos serviços e funcionalidades actuais do Tecnopólo do Vale do Tejo. No futuro, o Tecnopólo vai acolher um fórum empresarial, com auditório e centro de feiras e exposições, e as novas instalações da Escola Superior de Tecnologia de Abrantes." (Jornal «O Mirante» de 20/05/2010)

Movimento 'uma playmate em cada turma'




Se eu mandasse todas as professoras posariam nuas na Playboy. Primeiro, por uma questão de disciplina. Nenhum aluno arrisca a expulsão da sala onde lecciona a Miss Fevereiro

Na qualidade de antigo aluno, a notícia da professora de Mirandela que posou nua na Playboy deixa-me indignado: no meu tempo não havia professoras destas. Na qualidade de cidadão que já foi capa da Playboy, o facto de a professora ter sido suspensa faz com que esteja solidário: nós, as coelhinhas, devemos unir-nos. Devo dizer, aliás, sem querer ser corporativista, que, se eu mandasse, todas as professoras posariam nuas na Playboy. O Ministério da Educação continua entretido com programas e avaliações e ignora aquilo de que o nosso sistema educativo precisa: professoras nuas. Primeiro, por uma questão de disciplina. Nenhum aluno arrisca a expulsão da sala onde lecciona a Miss Fevereiro.
Segundo, por razões de concentração no estudo. Qualquer jovem aluno já deu por si a imaginar a professora sem roupa. Eu não fujo à regra, e aproveito a oportunidade para pedir desculpa à Irmã Genoveva. Mas os alunos de professoras que posam na Playboy não perdem tempo com distracções dessas: não precisam. Se querem ver a professora despida, abrem a revista na página 49. Na sala de aula, concentram-se na compreensão da matéria.
Terceiro, para conseguir o desejado envolvimento da comunidade no processo educativo. Os encarregados de educação mais desinteressados passam a frequentar todas as reuniões de fim de período: os pais desejam ver a professora; as mães desejam verificar se os pais não se entusiasmam demasiado com o visionamento da professora. Padrinhos que não vêem o afilhado desde a pia baptismal virão de longe para se inteirarem do aproveitamento escolar do miúdo.
Infelizmente, a vereadora da Educação da Câmara de Mirandela pensa de outro modo. A exibição pública voluntária do corpo nu está interdita às docentes. Não se sabe a que outras profissões se alarga esta inibição. Canalizadoras podem posar sem roupa sem desprestigiar o nobre ofício de vedar uma torneira? Empregadas de escritório podem deixar-se fotografar nuas sem melindrar os carimbos? Ninguém sabe ao certo, mas parece urgente definir com rigor que outras profissionais estão deontologicamente impedidas de fazerem com o seu corpo o que quiserem.
Mais do que a suspensão, deve colocar-se em causa a recolocação da professora. O receio de alarme social levou a Câmara a retirar a docente do contacto com os alunos e a enviá-la para o arquivo municipal. Ora, o contacto com bibliotecários de óculos grossos que não vêem uma pessoa do sexo feminino nua desde 1977 não será mais perigoso e socialmente alarmante do que o convívio com jovens? Fica a pergunta, para reflexão das autoridades fiscalizadoras da nudez"

quarta-feira

The Waste Land por T. S. Eliot





I. THE BURIAL OF THE DEAD


APRIL is the cruellest month, breeding
Lilacs out of the dead land, mixing
Memory and desire, stirring
Dull roots with spring rain.
Winter kept us warm, covering 5
Earth in forgetful snow, feeding
A little life with dried tubers.
Summer surprised us, coming over the Starnbergersee
With a shower of rain; we stopped in the colonnade,
And went on in sunlight, into the Hofgarten, 10
And drank coffee, and talked for an hour.
Bin gar keine Russin, stamm' aus Litauen, echt deutsch.
And when we were children, staying at the archduke's,
My cousin's, he took me out on a sled,
And I was frightened. He said, Marie, 15
Marie, hold on tight. And down we went.
In the mountains, there you feel free.
I read, much of the night, and go south in the winter.
What are the roots that clutch, what branches grow
Out of this stony rubbish? Son of man, 20
You cannot say, or guess, for you know only
A heap of broken images, where the sun beats,
And the dead tree gives no shelter, the cricket no relief,
And the dry stone no sound of water. Only
There is shadow under this red rock, 25
(Come in under the shadow of this red rock),
And I will show you something different from either
Your shadow at morning striding behind you
Or your shadow at evening rising to meet you;
I will show you fear in a handful of dust. 30
Frisch weht der Wind
Der Heimat zu.
Mein Irisch Kind,
Wo weilest du?
'You gave me hyacinths first a year ago; 35
'They called me the hyacinth girl.'
—Yet when we came back, late, from the Hyacinth garden,
Your arms full, and your hair wet, I could not
Speak, and my eyes failed, I was neither
Living nor dead, and I knew nothing, 40
Looking into the heart of light, the silence.
Od' und leer das Meer.
Madame Sosostris, famous clairvoyante,
Had a bad cold, nevertheless
Is known to be the wisest woman in Europe, 45
With a wicked pack of cards. Here, said she,
Is your card, the drowned Phoenician Sailor,
(Those are pearls that were his eyes. Look!)
Here is Belladonna, the Lady of the Rocks,
The lady of situations. 50
Here is the man with three staves, and here the Wheel,
And here is the one-eyed merchant, and this card,
Which is blank, is something he carries on his back,
Which I am forbidden to see. I do not find
The Hanged Man. Fear death by water. 55
I see crowds of people, walking round in a ring.
Thank you. If you see dear Mrs. Equitone,
Tell her I bring the horoscope myself:
One must be so careful these days.
Unreal City, (...)"

poderá consultar completo em http://www.bartleby.com/201/1.html

terça-feira

Manual de instruções para um país por Ricardo Costa

"Caro leitor: se por acaso, mérito ou azar um dia tiver que governar um país em crise, siga estas regras. Não terá glória imediata, acenos à janela nem rotundas com o seu nome. Mas talvez se safe (a si e ao país), o que já não é nada mau.

Se Portugal fosse um electrodoméstico, a esta hora José Sócrates estaria a revirar gavetas à procura do manual de instruções e a praguejar com os assessores por não o terem obrigado a ler o documento. Enquanto não o encontra, deixo-lhe estas dicas:

1. Olhe para o espelho e diga: "porquê eu"? Mas não espere pela resposta, não é boa para si.

2. Vá jantar fora com os amigos, ao cinema (o "Homem de Ferro 2" estreou anteontem) e durma uma boa noite de sono.

3. De manhã, leia os jornais estrangeiros. Não se refugie em Pessoa ou no Padre António Vieira para não achar que está num grande país. Não está.

4. Chame o ministro das Finanças e diga-lhe: agora só nós dois é que governamos.

5. Consolide a despesa dos ministérios e entregue tudo a autorização prévia das Finanças.

6. Crie um gabinete de crise.

A gestão de informação é vital.

7. Proíba conferências de imprensa de outros ministros. Só pode haver um discurso.

8. Faça uma lista de tudo o que vai cortar de imediato.

9. Anuncie tudo de uma vez.

10. Revele o impacto orçamental das medidas e anuncie metas claras. Os objectivos devem ser transparentes.

11. Suspenda o TGV, o aeroporto, a nova travessia do Tejo e as novas auto-estradas. Negoceie o adiamento com os consórcios. Se não aceitarem, litigue. O país está do seu lado.

12. Comunique à NATO que precisa de vender (ou ceder o renting) dos submarinos.

13. Suba o IVA um por cento.

14. Tente renegociar prazos de pagamento de alguma dívida, PPP, contratos de fornecimento externos e concessões.

15. Reestruture o sector empresarial do Estado, funda empresas e institutos. Reduza os custos variáveis em 20% este ano com um forecast obrigatório.

16. Não privatize nada enquanto a crise não passar.

17. Não desorçamente nada.

18. Tente financiar-se no mercado interno. É mais barato.

19. Proíba a candidatura ao Euro 2016 e à Ryder Cup.

20. Chame o FMI e diga que não quer nenhum empréstimo.

21. Diga o mesmo, por telefone, a Angela Merkel.

22. Chame as agências de rating e explique-lhes o plano.

23. 20 e 21 de Maio pague 6,9 mil milhões de dívida vencida.

24. Depois, com os mercados calmos, reforce o investimento no parque escolar e na saúde pública. Em tempo de crise vão ser mais procuradas do que nunca.

25. Apoie as exportações (mas esqueça a Venezuela).

26. Obrigue o Estado a ser modesto, sério e implacável.

27. Não leia Keynes por uns tempos. Mais vale ver a Oprah."

Texto publicado na edição do Expresso de 1 de Maio de 2010



sexta-feira

Há um bocadinho de Neandertal dentro de nós

"O debate durou anos: o homem moderno (nós) e o Homem de Neandertal, hoje extinto, ter-se-iam cruzado e procriado juntos – ou não? Hoje a questão foi definitivamente arrumada pela genética, com a publicação na "Science" do primeiro rascunho do genoma dos Neandertais. A resposta? Sim! A criança do Lapedo teve de facto Neandertais entre os seus antepassados.

Há meses que nos diziam que a primeira sequenciação do genoma do Homem de Neandertal estava quase pronta. Já está. E proporcionou uma primeira grande surpresa aos próprios autores do trabalho (que, como muitos outros especialistas, não acreditavam nesta possibilidade), ao confirmar que os humanos modernos acasalaram e procriaram com Neandertais. Simplesmente, porque descobriram bocadinhos de sequências genéticas de Neandertal no nosso ADN.

A equipa internacional liderada por Svante Pääbo, do Instituto Max Planck de Antropologia Evolutiva de Leipzig, na Alemanha, demorou quatro anos a ler os genes desse ser humano, extinto há cerca de 30 mil anos – uma proeza técnica que, segundo os autores, vai ao mesmo tempo permitir perceber o que é que nos distingue deles do ponto de vista evolutivo.

“Há seis ou sete anos, eu pensava que a sequenciação da totalidade de um genoma antigo era algo que não iria acontecer durante a minha vida”, disse ontem Pääbo no início de uma conferência de imprensa telefónica convocada pela revista Science. O grande problema, explicou, é que “mais de 90 por cento do ADN encontrado nos fósseis provinha de bactérias ou de fungos” – ou seja, pertencia aos microrganismos que tinham contaminado os ossos após a morte dos indivíduos em questão. Para mais, os fragmentos de ADN obtidos eram extremamente curtos e tinham sofrido alterações químicas. Isto sem esquecer que a sua mera manipulação corria o risco de introduzir uma contaminação adicional, com o próprio ADN dos cientistas – o que é absolutamente indesejável quando se trata justamente de determinar se há genes de Neandertal em nós ou genes nossos neles... Uma grande parte do trabalho e das técnicas desenvolvidas tinha portanto como objectivo garantir a autenticidade da proveniência do ADN em estudo.

Os cientistas extraíram o ADN principalmente de três fragmentos de osso fossilizado de três mulheres Neandertais, que tinham sido encontrados numa gruta na Croácia entre o fim da década de 1970 e o início da de 1980. Dois desses ossos foram datados com precisão e têm respectivamente 38 mil e 44 mil anos. A partir daí, conseguiu-se reconstituir, nesta primeira fase, cerca de 60 por cento da totalidade dos três mil milhões de pares de bases (ou “letras”) do ADN dos Neandertais.

Aconteceu no Médio Oriente
Os cientistas também sequenciaram cinco genomas de humanos actuais, de origem europeia, asiática e africana, para fins de comparação com o genoma fóssil – e compararam ainda esse genoma com o do chimpanzé. E descobriram que os Neandertais são, do ponto de vista genético, ligeiramente mais próximos dos humanos modernos fora de África do que dos africanos actuais. A explicação que dão para isto é que, pouco depois de terem saído de África à conquista do mundo, há uns 80 mil anos, provavelmente algures no Médio Oriente (antes de chegarem à Europa), os primeiros homens modernos cruzaram-se com os Neandertais e produziram descendência.

Isso não significa que não tenha havido, mais tarde, novos encontros e novos cruzamentos, nomeadamente na Europa. Mas o “fluxo genético” agora detectado – sempre dos Neandertais para os humanos actuais e não em sentido oposto – aponta para um contacto mais precoce, logo à saída de África. A ausência de provas não significa que não tenha havido contactos ulteriores, mas simplesmente que não foi possível detectar sinais genéticos desses contactos, argumentam os cientistas.

Seja como for, os seres humanos actuais, da Austrália à Europa, passando pela Ásia (mas não por África), herdaram, naquela altura, bocadinhos de sequências genéticas de Neandertal que continuam, ainda hoje, espalhadas pelo nosso ADN. Os cientistas estimam que entre um e quatro por cento do genoma dos humanos actuais provenha dos Neandertais. Num comunicado, referem mesmo que o genoma do célebre “caça-genes” norte-americano Craig Venter, recentemente publicado, contém segmentos que são mais próximos do genoma de Neandertal do que do genoma “de referência” humano, que inclui uma mistura de ADN de origem europeia e africana! “Um a quatro por cento do meu genoma é Neandertal”, salientou Pääbo na conferência de ontem. “Eles não se extinguiram totalmente, continuam a viver em nós.” Contudo, as sequências genéticas identificadas como provenientes dos Neandertais estão distribuídas ao acaso pela molécula de ADN e não correspondem a nenhum traço identificável que alguns de nós poderíamos ter em comum com eles.

Para Pääbo, “o mais fascinante” disto tudo é, porém, a possibilidade de utilizar este genoma fóssil para procurar provas da selecção “positiva” de traços genéticos, ou seja, de características genéticas que se fixaram ulteriormente nos humanos modernos porque apresentavam vantagens do ponto de vista evolutivo em termos de sobrevivência da espécie – e que nos tornam únicos e diferentes dos Neandertais. A equipa já identificou várias regiões do genoma onde isto poderá ter acontecido, que têm a ver com o desenvolvimento mental e cognitivo (há três genes que, quando mutados, estão implicados na trissomia 21, na esquizofrenia e no autismo), bem como regiões relacionadas com o metabolismo energético, com o desenvolvimento do crânio, da clavícula e da caixa torácica.

Pertencemos à mesma espécie?
Para Pääbo, esta pergunta não faz sentido. “É um debate estéril”, frisou. “Nunca me pronunciei sobre isto e prefiro deixar essas lutas a outros. O que interessa é que mostrámos que o cruzamento reprodutivo era biologicamente possível entre os Neandertais e nós. Eu diria que eram diferente dos humanos – mas não assim tão diferentes como isso.”

“Há mais de dez anos que as provas arqueológicas e paleontológicas de hibridação cultural e biológica entre Neandertais e homens modernos se vêm acumulando”, disse João Zilhão, arqueólogo português da Universidade de Bristol, em conversa telefónica com o PÚBLICO. Juntamente com o seu colega Erik Trinkaus, da Universidade de Washington, Zilhão descobriu em 1998, no Vale do Lapedo, perto de Leiria, o esqueleto mais completo até à data de uma criança da nossa espécie que viveu no Paleolítico Superior (há cerca de 25 mil anos). O fóssil, afirmam desde então estes cientistas, apresenta uma mistura de traços modernos e de Neandertal.

Só que muitos especialistas discordavam desta interpretação – o que, para Zilhão, deixa de ser possível a partir de hoje. “Andámos a dizer isso há dez anos e têm-nos atirado à cara com os dados genéticos”, disse-nos hoje o investigador. E mostrou-se satisfeito com os novos resultados: “Era a última objecção contra o nosso modelo e isso é óptimo. Há que virar a página, o problema está resolvido.”

Mas então somos ou não da mesma espécie? “A dicotomia homem moderno/Neandertal é falsa”, responde-nos Zilhão. “É uma classificação vitoriana, do século XIX.” O Neandertal foi o primeiro homem fóssil a ser descoberto, um ser a meio caminho entre os macacos e o homem, “e isso encaixava no paradigma da evolução [das espécies]”. Para Zilhão, esta concepção tem criado uma resistência cultural subconsciente. “Como é que um fulano tão feio pode ser igual a nós?”, ironiza. “Do ponto de vista biológico, o que é importante é que, em termos reprodutivos, o homem moderno e o homem de Neandertal funcionam como uma única comunidade. Podiam acasalar. Isso é que conta.”

É provável, entretanto, que o crescente número de pessoas que recorrem a empresas que analisam o seu genoma venham a saber em breve se são portadoras de sequências genéticas vindas dos Neandertais. Até porque o genoma fóssil já foi colocado pelos autores na Internet, numa base de dados genética de acesso livre. Interrogado pelo PÚBLICO a este propósito durante a conferência de imprensa de ontem, Pääbo riu-se: “Tenho a certeza de que algumas dessas empresas vão oferecer isso aos seus clientes.” "

Quem morre? - Pablo de Neruda

"Morre lentamente
quem se transforma em escravo do hábito,
repetindo todos os dias os mesmos trajectos, quem não muda de marca
Não se arrisca a vestir uma nova cor ou não conversa com quem não conhece.
Morre lentamente
quem faz da televisão o seu guru.
Morre lentamente
quem evita uma paixão,
quem prefere o preto no branco
e os pingos sobre os "is" em detrimento de um redemoinho de emoções,
justamente as que resgatam o brilho dos olhos,
sorrisos dos bocejos,
corações aos tropeços e sentimentos.
Morre lentamente
quem não vira a mesa quando está infeliz com o seu trabalho,
quem não arrisca o certo pelo incerto para ir atrás de um sonho,
quem não se permite pelo menos uma vez na vida,
fugir dos conselhos sensatos.
Morre lentamente
quem não viaja,
quem não lê,
quem não ouve música,
quem não encontra graça em si mesmo.
Morre lentamente
quem destrói o seu amor-próprio,
quem não se deixa ajudar.
Morre lentamente,
quem passa os dias queixando-se da sua má sorte
ou da chuva incessante.
Morre lentamente,
quem abandona um projecto antes de iniciá-lo,
não pergunta sobre um assunto que desconhece
ou não responde quando lhe indagam sobre algo que sabe.

Evitemos a morte em doses suaves,
recordando sempre que estar vivo exige um esforço muito maior
que o simples fato de respirar. Somente a perseverança fará com que conquistemos
um estágio esplêndido de felicidade."